terça-feira, 22 de outubro de 2013

Da cana a casa: o processo da cachaça Leblon


Ali, o tempo, a rapaziada suava, cuidando nos alambiques, como perfeito se faz. Assim essas cachaças – a vinte-e-seis cheirosa – tomando gosto e cor queimada, nas grandes dornas de umburana.¹


1 ROSA, João Guimarães. Grande Sertão: Veredas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p 338.
2 João Guimarães Rosa (Cordisburgo, 27 de julho de 1908 — Rio de Janeiro, 19 de novembro de 1967), foi um dos mais importantes escritores brasileiros de todos os tempos. Foi também médico e diplomata.
3 Em tradução livre do francês, ―casa.

Em nossa jornada, se falarmos das coisas surpreendentes, uma das maiores delas foi descobrir o quão pequena pode ser uma empresa que produz cachaça. Ora, é possível pensar, a princípio, na vantagem que isso representa para o dono, isto é, em termos práticos, o pequeno cabe nos olhos; mas, nessa mesma linha de pensamento, é interessante ressaltar o pouco impacto que a pequenez – no sentido de representatividade econômica, jamais em termos pejorativos – causa na vida dos habitantes das redondezas da cachaçaria, que, no caso, dada as proporções, é uma multinacional. Todavia, isso, apesar de ser uma ótima reflexão, não é o assunto de hoje, amigos. Estamos aqui para falar da branquinha.
 Na epígrafe, dissemos dos rapazes do sertão de Rosa² que muito suaram na produção da cachaça apreciada por Riobaldo. 
No caso da Leblon, são quinze cortadores que dão conta do corte da cana-de-açúcar e da separação das palhas e pontas que não servem para produção da cachaça. Realizada a primeira seleção, as canas, estando já desvencilhadas do que não é útil à produção da bebida, ficam repousando na terra vermelha até que cheguem os caminhos que as levam para o alambique – importante dizer que todo esse processo se dá em um período de quarenta e oito horas, diferentemente do que ocorre em vários outros centros de produção da indústria da aguardente, nos quais a matéria-prima chega a ficar podre antes de ser encaminhada para o alambique –. Quando chegam a Maison³, um trator retira os feixes de cana e os coloca em uma esteira na qual há um funcionário que ajuda na moagem. Ao fim de tudo isso, deparamo-nos com um primeiro caldo cujo destino é a filtragem e um corte com água para padronizar os níveis de açúcar.
Temos nosso primeiro caldo! Há de se perguntar, amigo, o que acontece com ele, afinal, não é esse o ―caldo que costumamos beber. Ele é levado para uma sala repleta de tanques de aço inoxidável onde recebe leveduras que darão início à fermentação – é nesse momento que se cria e se regula a base a ser destilada nos alambiques de cobre, ou seja, as leveduras comem o açúcar do caldo e o transformam em álcool, gás carbônico e calor. Em uma bacia, fica a mistura para a base da fermentação, que tem um gosto azedo e nada agradável, mas que, pela experiência, vale a aventura. Digo de atenção também é o ambiente da sala: como o calor do método empregado torna o ar pesado, o cheiro do local não é nem mesmo um pouco convidativo.
Como puderam perceber, tudo se dá de maneira praticamente artesanal: avalia-se a acidez, a velocidade do trabalho das leveduras, os níveis de álcool, dentre outros. De acordo com um técnico da empresa, mesmo com esse rigoroso controle e com a possibilidade de gerar custos, às vezes há a necessidade de descartar amostras para que a qualidade do vinho a ser destilado seja mantida. Eis que chegamos a um ponto importante: a destilação.
A linha de alambiques de cobre transforma o álcool base em potentes cinquenta e cinco por cento de volume alcóolico. Separam-se a calda e cabeça que não são puras, portanto, indesejáveis e para casa de misturas são enviados os líquidos já destilados; é lá que se separa o que será destinado ao envelhecimento e ao amaciamento em tonéis.
A empresa, atualmente, conta com três produtos: a cachaça branca que dá nome ao negócio, Leblon; a cachaça envelhecida em barricas de carvalho, Signature Merlet; e o licor de açaí, Cedilha.



Ao fim da visita, a Maison Leblon oferece lembranças em suas lojas de presentes, incluindo o livro escrito por seu proprietário. Seguiremos contando nossa viagem no próximo post! Estará imperdível!




O Autor:
Rodolfo Sousa Bob Rodolfo Sousa Bob é gastrônomo, mixologista, treinador. Sommelier formado pelo SENAC. Especialista nível 2 Wine and Spirits Education Trust. Administrador do blog OBARVIRTUAL.

1 comentários:

Rodolfo Casalá disse...

Bacana o relato e a experiencia. em julho desse ano estive num alambique em Xanxeré (oeste catarinense) onde se faz a cachaça Refazenda (inclusive publiquei na época umas fotos no meu face) é fantástico foram tres dias intensos de mais muito aprendizado e passei pelos processos trabalhando botando a mão na massa junto com o Sr. Selito o proprietário do alambique e a equipe dele. Depois de passar por isto a gente olha a bebida com outros olhos, sem duvida. Muito bom, abraço meu xará.

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